Novo livro de Viriato Soromenho-Marques: «Entre o colapso e o desenvolvimento sustentável»
Viriato Soromenho-Marques, 47 anos, é professor catedrático da Universidade de Lisboa. Foi presidente da direcção nacional da Quercus, entre 1992 e 1995. Membro do Conselho Nacional do Ambiente e do Desenvolvimento Sustentável desde 1998, e vice-presidente da rede europeia de conselhos de ambiente e desenvolvimento sustentável (EEAC-European Environmental and Sustainable Development Advisory Councils) desde 2001. Em 2004 foi um dos autores da Estratégia Nacional para o Desenvolvimento Sustentável (ENDS). Autor de uma vasta bibliografia, o Quercus-Ambiente convidou-o para uma breve entrevista a propósito da sua mais recente obra, saída no início do Verão.
Como lhe surgiu a ideia de publicar este seu mais recente livro «Metamorfoses. Entre o Colapso e o Desenvolvimento Sustentável»? A ideia surgiu a partir da compreensão de que existe um fio condutor comum em muitos dos meus escritos dos últimos anos. Com efeito este livro reúne 11 textos escritos nesse período, embora com fortes alterações e actualizações, dominados pela preocupação e a urgência do desenvolvimento sustentável. Esse tema unificador é equacionado em três perspectivas distintas: a) como grande tópico da política internacional; b) como assunto do debate político e cultural português; c) como questão central emergente no que diz respeito ao futuro da condição humana, que está hoje em causa mercê das possibilidades selectivas e eugénicas contidas nas biotecnologias.
Por que é o tema do desenvolvimento sustentável tão urgente? Porque perdemos nos últimos anos, sobretudo desde que o principal responsável político da única superpotência decidiu enterrar a cabeça na areia em relação às alterações climáticas, a noção de que estamos a viver uma crise absolutamente essencial para o futuro da própria civilização. A alternativa a um modelo de sustentabilidade será, de facto, o colapso, com o seu cortejo de barbaridades, que incluem a guerra e a pobreza generalizadas.
É a isso que se refere quando no seu terceiro ensaio fala em «segurança ambiental»? Sem dúvida. Só a mais profunda ignorância pode explicar que alguém possa supor ser possível estabilizar uma ordem democrática e pacífica, num mundo cada vez mais dividido entre pobres e ricos, entre os que vivem na opulência e os que nem sequer acesso a água potável possuem. A essência do desenvolvimento sustentável é essa mesma: só pode existir desenvolvimento no quadro da oportunidade económica, da justiça social e do equilíbrio ecológico. Esta é uma tese de simples bom-senso. Até um homem como Blair a defendeu correctamente na última cimeira do G-8.
E Portugal? Como é que estamos em matéria de sustentabilidade? A marcar passo. Infelizmente a situação ainda se agrava mais quando percebemos que a União Europeia está sem estratégia nem rumo. A nova Comissão parece ter «congelado» o ambiente e a sustentabilidade. Durão Barroso poderia ficar na história europeia, mas por este andar corre o risco de ficar numa simples nota de roda-pé...
Qual o papel das ONG como a Quercus? O papel da Quercus é analisado na II Parte do livro, quando explico as condições da sua fundação, em 1985. Cada vez mais o papel das ONG é o de serem firmes e teimosas representantes do interesse público e da sociedade civil. Faço votos para que a Quercus ganhe um novo fôlego para os próximos vinte anos de existência!
“No fundo o que está em causa é, nada mais nada menos, do que a base efectiva da própria crença no progresso, que alimentou as várias mitologias e narrativas, tanto sagradas como profanas. Primeiro na Europa, e depois em todos os continentes e culturas. Seremos capazes de atravessar esta tempestade de arrogância e desmesura? Seremos capazes de administrar correctamente o poder da técnica e da ciência, no sentido da maior justiça entre os humanos e do maior cuidado para com todas as outras criaturas que connosco partilham o tempo e o espaço? Seremos capazes de habitar sabiamente a Terra? Estas perguntas situam-se numa região limite. Para elas não há uma resposta rigorosa, mas apenas o testemunho de uma aposta (...).
A representação contemporânea da nossa crise ambiental e social global oscila, desta forma, entre a expectativa do pior e a esperança resiliente, entre o risco de colapso e a perspectiva duma mobilização planetária, capaz de assegurar, certamente num parto difícil e doloroso, a transição para uma sociedade, simultaneamente, dinâmica e sustentável.”