Associações: Jornalistas de ambiente e ciência criam associação
Há uma nova associação para o jornalismo da ciência e do ambiente em Portugal. A ARCA pretende criar pontes, entre os cidadãos e a ciência, entre a sociedade civil e os decisores ambientais, promovendo qualidade, rigor e protagonismo.
"A ARCA tem um papel importantíssimo a fazer: melhorar a qualidade da comunicação actualmente feita através da comunicação social, para que a sociedade civil perceba o que é que a comunidade científica faz, perceba o que é que os decisores ambientais fazem, porque é ela que paga tudo isso, e portanto tem o direito de saber o que é que se passa. Estabelecer uma ponte, entre uns e outros, é importante". Quem o diz é Humberto Vasconcelos, presidente da recém criada Associação de Repórteres de Ciência e Ambiente (ARCA).
A primeira apresentação pública da ARCA decorreu no passado dia 2 de Fevereiro, com a conferência “Os jornalistas no ambiente da ciência”, realizada na Culturgest, que reuniu jornalistas, membros da direcção da associação, cientistas, ambientalistas, e também o presidente da EUSJA – União Europeia das Associações de Jornalistas de Ciência.
Uma nova ARCA
“O objectivo principal da ARCA é promover e melhorar a qualidade e o rigor do jornalismo de ciência e ambiente. Depois, há diferentes formas de abordagem para chegar a esse objectivo”, afirma Ricardo Garcia. E concretiza: “Eu penso que há duas linhas de acção principal. Uma é a de acções de formação, directamente com os jornalistas. Isso faz falta em Portugal, praticamente não há, podem-se contar pelos dedos de uma mão os cursos para jornalistas de ciência e ambiente, ou para jornalistas em geral que costumam uma vez ou outra tratar temas de ambiente ou de ciência. Uma das ideias é promover workshops ou cursos ou viagens de estudo. Outro objectivo é tentar lutar para que o ambiente e a ciência tenham mais protagonismo dentro dos jornais. Trata-se de uma luta mais interna, que passa por convencer os editores e trabalhar dentro das redacções, para que a ciência e o ambiente deixem de ser um gueto”.
A ARCA começa a sua actividade com cerca de vinte associados. Mas porquê agora, já que o jornalismo de ciência e ambiente já existe há vários anos em Portugal? Ricardo Garcia responde: “Foi quase um acaso. Já houve tentativas anteriores. No começo dos anos noventa houve uma tentativa de criação de uma associação de jornalistas de ambiente, depois ao longo dos anos noventa houve outra de jornalistas de ciência. A minha opinião é que o jornalismo de ciência e de ambiente ainda não estava maduro, nessa altura. Ou seja, ainda não havia pessoas suficientes a trabalhar na área. E eu penso que agora não só há mais gente, como o ambiente e a ciência ganharam algum espaço nos jornais, mesmo os jornalistas não especializados escrevem mais sobre ciências e sobre ambiente. Por isso já estava maduro. Precisava era de um catalisador. E esse catalisador foi uma viagem que a Filomena Naves, que é vice-presidente da Associação, fez. Conheceu o István, conheceu a federação, e veio com a ideia de criar cá o que já havia noutros países. E quando juntámos um grupo, isso teve uma receptividade muito grande”.
Uma rede europeia
A EUSJA nasceu em 1971, conta István Palugyai, com “o principal objectivo de desenvolver uma rede europeia de associações nacionais de jornalistas de ciência; para reforçar esta actividade, a nossa existência, também para reforçar os laços de amizade entre os jornalistas de ciência na Europa”. Actualmente, concretiza, “a EUSJA organiza todos os anos várias visitas, viagens de estudo, para jornalistas de ciência membros da União.
Jornalistas de Portugal, por exemplo, podem visitar um instituto de pesquisa na Alemanha, na Itália, no Reino Unido, na Suécia ou em Moscovo, porque nós temos também associações de países que não são membros da União Europeia, como a Croácia e a Rússia. E os jornalistas podem fazer as visitas, escrever histórias e, também, juntar-se e conhecer pessoas, o que é muito importante”.
Actualmente, mais de dois mil jornalistas são membros. István Palugyai espera que entretanto adiram “quatro novas associações nacionais: Portugal, Bélgica, Noruega e República Checa”.
A situação das associações de jornalismo de ciência e ambiente, bem como da comunicação da ciência, varia entre os países europeus. De acordo com um estudo realizado pelo presidente da EUSJA, de entre as associações de jornalistas de ciência com boas práticas são de referir o Reino Unido, que tem competições anuais, bolsas e publicações como a revista "Science Reporter", mas também a Finlândia, a Suiça, a Itália e a Hungria, com um curso próprio, entre outras iniciativas. Por sua vez, o Reino Unido, a Alemanha, a França e a Itália são os países que se destacam pela sua grande tradição na comunicação da ciência.
Comunicar a ciência e o ambiente
Se a recém criada ARCA ainda não tem estudos para apresentar, algumas perspectivas são já possíveis. De acordo com Ricardo Garcia, “algumas revistas desapareceram, mas outras surgiram. O Diário de Notícias perdeu muito espaço, e isso é muito importante porque é um dos principais diários, o Público mantém algum, mas perdeu as páginas especiais que publicava há uns anos sobre ciência e ambiente. O espaço varia muito com os temas que estão na actualidade e também com as preocupações do momento. Considero que o ambiente tem potencial em Portugal, porque sempre que há um tema forte, consegue-se colocá-lo no topo da agenda. As televisões muitas vezes já abrem os noticiários com temas de ambiente”.
Humberto Vasconcelos considera que a parte dedicada ao ambiente e à ciência tem diminuído nalguns órgãos de comunicação social, mas noutros o mesmo não se passa. E concretiza: “o Público serve bem os seus leitores, o Diário de Notícias serve mal e já serviu bem. É difícil, às vezes, que os jornais tratem deste ou daquele assunto. E os cientistas não sabem como funciona um jornal. É que acima do jornalista existe uma cadeia hierárquica que decide os espaços e as notícias que se metem. E as pessoas não estão minimamente sensibilizadas. Porquê? Porque o jornalismo actual é um jornalismo de tablóide. Grandes títulos e depois amanhã já ninguém se lembra”.
Sofia Vilarigues QUERCUS Ambiente nº. 13 (Março/Abril de 2005)